Um palavrão desses assusta logo de cara, mas decidi escrever essa coluna pois tenho ouvido uma série de relato de Ironmans e futuros Ironmans falando do milagre e da devastação que a Coca-Cola pode causar na famosa maratona da prova. Antes de falar exatamente sobre o processo de rebote precisamos entender um pouco, mesmo que superficialmente, como funciona o processamento dos carboidratos dentro do nosso corpo e como isso pode nos ajudar durante uma prova de endurance.
Após treinar seu sistema muscular, afinar toda a sua resistência e estar focado 100% no seu desempenho chega o dia tão esperado da prova. Podemos ter nos transformado em uma ferrari nas 20 semanas de treino que antecedem um Ironman porém se não usarmos a “gasolina” necessária para acelerar essa máquina logo ficaremos na mão e até os fusquinhas nos farão comer poeira, isso é exatamente o que acontece com quem esquece de se conhecer e planejar a sua alimentação/hidratação durante a prova. Ao ser exposto ao esforço intenso o corpo necessita avidamente de energia para que o seu sistema muscular continue rendendo o que pode e para que as suas funções vitais possam continuar estáveis e nesse caso o principal responsável por isso tudo é o carboidrato (não o único porém o mais importante). É importante que a nossa hidratação esteja balanceada para que as reações químicas continuem acontecendo dentro do nosso corpo e assim a liberação de energia possa acontecer sem interrupções abruptas ou “efeitos colaterais” desagradáveis. A fórmula a grosso modo é simples: Você ingere o carboidrato (antigamente chamado de “açúcares”), o pâncreas libera uma enzima chamada amilase que é responsável por quebrar essas cadeias de CHO (abreviação para carboidratos) os transformando em glucose para aí ser absorvidos pelo sangue com a ajuda de liberação de insulina e transformados em ATP (energia).
O que é hipoglicemia de rebote?
Para visualizar melhor, imagine a seguinte cena: Você fez uma prova perto do seu esforço planejado, nadou bem, pedalou com esforço e está começando a corrida. Passa 15, passa 20, passa 30 km e naquele momento não existe mais ateu, tudo dói e você quer algo que imediatamente lhe dê uma injeção de energia. Ao visualizar o próximo posto de hidratação você vê aquela garrafa vermelha, LINDA, chamada Coca-Cola. É muito açúcar e alegria dentro de uma coisa só e você nem pensa duas vezes, manda ver três copos de uma vez pra aguentar até o final da maratona. Volta a correr e de repente BOOM, seu mundo caiu. Tontura, vômito, fraqueza e um só pensamento: MEU, ONDE FOI QUE EU ERREI? Fique calmo, a culpa não foi daquele coletivo que você faltou ou do longo de domingo que você mentiu pra galera que tava doente pra poder dar uma descansadinha a mais, a culpa foi do bandido do rebote.
Após tanto esforço suas reservas de energia estão indo para o espaço, você está hipoglicêmico (com baixa concentração de glucose no sangue) , ávido por energia e a Coca está lá para fazer esse milagre (lembra que os CHO são os principais produtores de energia no nosso corpo?), você ingere uma quantidade de refrigerante considerável e é aí que a mágica acontece, ao querer melhorar rapidamente você ingere uma quantidade muito alta de açúcar, o pâncreas libera uma quantidade muito grande de insulina o que gera automaticamente um processamento rápido e uma queda drástica (novamente) dos níveis de glicose no sangue, que o faz ficar o que? Hipoglicêmico novamente! Só que dessa vez passando muito pior pois com esse aumento considerável de insulina o seu corpo agora opera sobrecarregado. Esse é o principal motivo da Coca-Cola ser tão folclórica na maratona do Iron, pois a diferença entre o veneno e o remédio está justamente na dose e é muito difícil descobrir naquele momento, depois de ter nadado 4k, pedalado 180k e corrido uma porrada de Ks quantos mL de Coca vão ser necessários para te tirar daquela situação. É difícil de entrar na cabeça naquele momento que a ingestão de altas doses de açúcar vai fazer com que o atleta fique hipoglicêmico, mas é assim que funciona nesse caso.
Como fazer para evitar o rebote?
Na dúvida seja moderado. É preciso ter um conhecimento muito grande do próprio corpo para saber em que nível de desespero estamos porém caso ache que a vida está terminando e a Coca-Cola vai ser a única heroína a te tirar daquela situação, faça uso desse artificio com cautela. A suplementação normal e alimentação podem facilmente te levar até a linha de chegada, por isso dê preferência aos alimentos sólidos durante o pedal e no começo da corrida (que é o momento aonde o seu corpo ainda consegue “aceitar” esse tipo de alimentação sem reclamar tanto) e deixe as suplementações em gel e líquido para o final da corrida. O x da questão está em manter o equilíbrio, em uma prova de desgaste extremo como o Ironman o corpo precisa estar “tranquilo”.
Como fazer para sair de lá caso caia na armadilha?
A melhor saída é fazer uso de um carboidrato de ação rápida junto de um carboidrato de ação lenta, como você estará hipoglicêmico essa energia será fundamental para que o seu corpo volte a funcionar de maneira mais eficiente. Um pão integral com mel pode ser uma excelente pedida pois o mel atua instantaneamente no reajuste do seu índice glicêmico enquanto o pão vai fazendo a manutenção da energia de forma mais gradativa. Nessa altura do campeonato pode ser bem chato ter que comer algo mas é uma boa saída para tentar reverter esse quadro.
A Coca cola pode ser sim uma ótima alternativa nesse caso específico mas como dito anteriormente deve ser usada com muita cautela, você não vai querer botar uma prova dessas a perder por causa disso vai? Tenha calma e tente analisar com inteligência todas as suas alternativas, a chegada é logo ali e no final vai dar tudo certo! Gostaria de agradecer a minha professora Dra. Fabíula Regina Stevan que me ajudou em algumas dúvidas mais técnicas a respeito dessa minha primeira coluna a respeito de nutrição aqui no blog, que seja a primeira de muitas. Boa prova a todos.
Andre Raittz.
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